sexta-feira, 28 de setembro de 2007

Muro

Muro, ideologia, religião, raça, dinheiro, nacionalidade, parede, grade, morte, sexo, paixão, ódio, nome, gosto, estética, necessidade, cova, cerca, placa, cargo, classe, palavra, carne, amigo ,tempo, mundo, vidro, fogo, medo, orgulho, posse, compromisso, inimigo, distância ou seja qual for a barreira, aqui não existe.

Só o amor.

quarta-feira, 26 de setembro de 2007

Onde os Espelhos não Mentem

Olhou para o espelho por muito tempo. Sua vista começou a se tornar confusa de tanto tempo que fitou o vidro de se ver. Esperava encontrar alguém conhecido mas lá estava aquela pessoa estranha. Olhando para ela como quem a conhece, mas quem era aquela pessoa? Quer dizer, devia ser ela, já que se movia da mesma forma... já que estava no espelho... mas não era ela.
A luz do banheiro mudou e os sons da rua desapareceram. Apoiou as mãos na pia no mesmo instante que a imagem o fez. E então tocou seus lábios no mesmo instante que a pessoa no espelho. Sem saber quem era aquela pessoa.
Estranho demais, mas o olhar no espelho parecia conhecê-la, mas ela não sabia quem estava ali. Era angustiante demais.
Foi então que o sol se pôs e a luz foi embora. Foi então que percebeu que sem aquela luz ela mesma não existia, não podia se ver ou saber onde começava e onde terminava. Foi então que percebeu que era ela o reflexo no espelho.
A luz então se apagou. A estranha foi embora sem jamais notar um rápido instante de agonia em seu reflexo, que desapareceu de forma tão cotidiana.

Fim do Tempo

E ali estavam os dois, à beira do fim do tempo. Nada mais fazia sentido além daquele abismo. Ele já havia ido o mais longe que podia, mas ela... ela ainda queria mais. O mundo e as suas formas já havia desaparecido. O que... anos atras? Difícil saber estando assim tão perto do fim do tempo.
Estranhamente se podia notar que todos os tempos acabavam ali. Tanto o passado quanto o futuro se encontravam ali. E o presente era o único que ainda parecia resistir. Um presente nebuloso, sem passado e sem futuro. Uma dúvida corroendo os dois. O que há além do fim do tempo?
Uma voz então se fez ouvir, mas o que ela dizia era esquecido assim que dito, como se fosse a tanto tempo que nem mesmo as palavras eram as mesmas mais.
Ela então pisou naquele imenso vazio. Urgente como todo homem quando se trata de sua mulher, ele também foi. Seguiram para aquele lapso. E lá então encontraram a resposta final. O fim do tempo e todas as coisas que existiram em suas faces. Seus ecos e suas sombras. Suas formas e seus volumes. Tudo em um instante eterno.
Desapareceram para sempre no sempre que deixou de existir. Então foi o fim do tempo e ali mesmo o para sempre acabou para os dois.
...
..
.






http://frankfrazetta.org/

terça-feira, 25 de setembro de 2007

O Pequeno Bob

A cidade era como um modelo de gesso. Não parecia real. Tudo era branco. Calcário. A luz leste fazia com que meu olho esquerdo se fechasse por excesso de luz. Doía a vista. As ruas eram de um branco amarelado, de pedras compostas em mosaico. Um desenho anárquico agrupado pelo cimento de brancura impressionante.
E um menino descia a rua. Vento em seus cabelos negros e soprando sua pipa para o alto. A ladeira era íngreme. Ele corria com pernas magras e longas. A pipa amarela então ascendeu até o azul do céu e o menino parou de correr. Num barranco onde a grama verdejava e as margaridas floriam, ele olhou para o alto e contemplou seu brinquedo que dançava no céu de primavera.
Era como um sol. Era como uma lua. Não havia outro igual. Era o mais luminoso onde quer que estivesse. E soltou uma gargalhada que parecia um soluço de felicidade, enquanto as aves lhe faziam sombra no rosto e passavam das laranjeiras e limoeiros do grande quintal próximo, entre a linha de sua pipa, até desaparecerem nas colinas depois de duas casas.
Me disseram que ele era o pequeno Bob. Bom de ver brincar. Roubava limão e comia com sal. Chutava bola. Jogava pedra. Se escondia no mato. Vivia de joelho ralado. Fiquei no banco da rua, sentado, até que o sol subiu alto demais e o menino foi para casa almoçar. A senhora que me falou dele também foi almoçar.
Peguei minhas coisas debaixo do banco. Minha sacola de roupas e minha trouxa de comida, e fui embora da cidade, pela estrada mais verde que havia por ser atravessada. A floresta que havia à frente parecia mais fresca. Segui meu caminho ainda por muitos anos, sem jamais me esquecer da risada daquele menino. Era como meu filho.